Receita Federal pode tributar crédito de PIS/Cofins após encerramento de ação

 In Uncategorized

Uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, no Rio de Janeiro, pode afetar o caixa de empresas que discutem a exclusão do ICMS do cálculo do PIS e da Cofins – a chamada “tese do século”. Os desembargadores da 3ª Turma Especializada definiram que o contribuinte, ao vencer a disputa e ter o processo encerrado, deve pagar à União, imediatamente, 34% do valor a que tem direito.

Essa fatia é referente ao recolhimento de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL, que incidem sobre o acréscimo ao patrimônio da empresa. Trata-se, segundo advogados, da “ressaca” da vitória que os contribuintes tiveram no Supremo Tribunal Federal (STF).

Depois de os ministros decidirem que o imposto estadual não poderia compor o cálculo do PIS e da Cofins, em março de 2017, os processos que estavam parados nos tribunais regionais voltaram a tramitar e, aos poucos, estão sendo encerrados.

Agora, a discussão envolve o momento em que esses créditos de PIS e Cofins, garantidos por decisão judicial, serão tributados. O contribuinte defende a data de uso. Mas os desembargadores do TRF deram razão à Receita Federal e determinaram que o recolhimento de IRPJ e CSLL tem de ocorrer já no trânsito em julgado (encerramento do processo).

Esse tema foi julgado por meio de um processo da TIM. O entendimento do relator, desembargador Marcus Abraham, foi seguido de forma unânime pelos demais julgadores. Ele afirma, no voto, que deve-se levar em conta, para a tributação, a disponibilidade jurídica do crédito (processo nº 50356 22-22.2019.4.02.5101).

“Se o crédito certo quanto à existência incorpora-se ao patrimônio da pessoa jurídica no momento do trânsito em julgado da sentença judicial que o reconheça, é de se concluir que esse crédito configura hipótese de incidência do IRPJ e da CSLL ante a aquisição da disponibilidade econômica”, diz.

A decisão de primeira instância beneficiava a TIM. O juiz havia autorizado até mais do que foi pedido. A companhia solicitava, no processo, que o recolhimento de IRPJ e CSLL ocorresse somente quando apresentasse o pedido de compensação à Receita Federal, ou seja, a data em que começaria a usar os créditos decorrentes da disputa do PIS e da Cofins para pagar tributos.

Constou na sentença, no entanto, que a tributação só poderia ocorrer com a homologação do pedido de compensação – o que pode ocorrer até cinco anos depois da data do pedido. O entendimento, na primeira instância, foi de que somente nesta etapa se poderia falar em crédito líquido, e, então, gerar a cobrança de IRPJ e CSLL.

Por meio de nota, a TIM afirma que foi notificada sobre a decisão do TRF da 2ª Região e que “o processo segue para as instâncias superiores”.

“Os desembargadores tiraram do cenário quatro, que é o mais favorável ao contribuinte, para o cenário um, que é o menos favorável”, diz Luca Salvoni, do escritório Cascione Pulino Boulos Advogados.

Esse cenário quatro foi adotado pelo TRF da 3ª Região, com sede em São Paulo, em decisão recente. A 4ª Turma entendeu que a tributação deveria ocorrer no momento da homologação da compensação ao julgar pedido de uma indústria química (processo nº 5033080-78.2019.4.03.0000).

A relatora do caso, desembargadora Marli Ferreira, ponderou que, no caso concreto, de crédito decorrente da exclusão do ICMS do cálculo do PIS e da Cofins, há “especial relevo”, já que contribuinte e Receita divergem sobre qual valor do imposto deve ser excluído. Ela se refere aos embargos de declaração apresentados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STF, ainda pendentes de julgamento.

No recurso, pede para que a decisão seja aplicada apenas para o futuro (modulação de efeitos), o que evitaria o reembolso, pela União, de valores já pagos. E questiona sobre qual ICMS deve ser retirado do cálculo do PIS e da Cofins – o que consta na nota fiscal ou o efetivamente recolhido, geralmente menor.

“Isso é tão importante que pode zerar o crédito da empresa. Temos clientes que zeram e temos clientes que podem ter o crédito reduzido em 90% se a decisão dos ministros for pela exclusão do ICMS destacado”, diz Rafael Vega, que atua com Luca Salvoni no escritório Cascione.

Os advogados afirmam que a tributação no momento do trânsito em julgado não faria sentido, além disso, porque quando se trata de mandado de segurança, não há fixação de valores. O juiz somente declara que o contribuinte tem o direito à exclusão do ICMS do cálculo do PIS e da Cofins. “Compete ao contribuinte, uma vez com o trânsito, fazer a conta e submeter esse valor à Receita”, diz Salvoni.

Especialista em tributação, Leonel Pittzer, sócio do Fux Advogados, enxerga um “meio do caminho” para essa situação. Ele cita o momento da habilitação do crédito. É a etapa posterior ao trânsito em julgado. O contribuinte apresenta a conta à Receita Federal e fornece documentos que dão respaldo ao crédito – a certidão do julgamento, por exemplo.

“A habilitação é como se fosse um requisito para que o contribuinte comece a compensar. Por isso o meu entendimento de que a disponibilidade jurídica só ocorre neste momento. A partir daí não existe mais nenhum obstáculo jurídico ao efeito financeiro que se dá via compensação”, afirma Pittzer.

Gilson Bomfim, procurador-chefe da Divisão de Acompanhamento Especial da PGFN na 2ª Região, diz que a tributação de créditos reconhecidos por decisão transitada em julgado não é nova e que não tem relação direta com a discussão do PIS e da Cofins.

“Acaba repercutindo. Mas não é específica a isso. Há regramento já de alguns anos, tanto da PGFN como da Receita, de que a tributação de crédito reconhecido por decisão judicial ocorre no momento do trânsito em julgado”, afirma ele, citando a Solução de Divergência Cosit nº 19, de 2003, e a Solução de Consulta Disit SRRF nº 233, de 2007.

Há respaldo no Código Tributário Nacional (CTN), acrescenta, que estabelece como fato gerador do Imposto de Renda “a disponibilização jurídica ou econômica”. Além disso, diz, as empresas do lucro real – aquelas que faturam mais R$ 78 milhões por ano – são obrigadas a escriturar despesas e receitas no regime de competência, ou seja, no momento em que ocorrem, independentemente do reflexo no caixa.

 

Fonte: Valor Econômico